Depois de ter realizado The Hand That Rocks the Cradle e L.A. Confidential, dois marcos do cinema da década de 90, Curtis Hanson aventurou-se no género melodramático e arrastou duas celebridades: Shirley MacLaine e Cameron Diaz.
O resultado final desta “aventura” é uma película consistente, verosímil e bem filmada. Poderia ser melhor e mais pungente mas não o é. No entanto, atrevo-me a dizer que In Her Shoes possui uma das cenas mais bonitas (desculpem-me o adjectivo banal mas é o que sinto) de 2005: a leitura do poema One Art de Elizabeth Bishop feita por uma Cameron Diaz disléxica a um idoso acamado.
One Art
The art of losing isn't hard to master;
so many things seem filled with the intent
to be lost that their loss is no disaster.
so many things seem filled with the intent
to be lost that their loss is no disaster.
Lose something every day. Accept the fluster
of lost door keys, the hour badly spent.
The art of losing isn't hard to master.
Then practice losing farther, losing faster:
places, and names, and where it was you meant
to travel. None of these will bring disaster.
I lost my mother's watch. And look! my last, or
next-to-last, of three loved houses went.
The art of losing isn't hard to master.
I lost two cities, lovely ones. And, vaster,
some realms I owned, two rivers, a continent.
I miss them, but it wasn't a disaster.
--Even losing you (the joking voice, a gesture
I love) I shan't have lied. It's evident
the art of losing's not too hard to master
though it may look like (Write it!) like disaster.
Elizabeth Bishop
O poema, brilhante descrição de uma arte cujo objectivo é alcançar a indiferença face àquilo que se perde, não vive de construir coisas mas sim de as perder. Tal como a personagem que, de emprego em emprego e de homem em homem, vai perdendo tempo, beleza e dignidade. Assim como o velho professor que perdeu a visão e aprendeu a viver com isso, refugiando-se na tarefa de ensinar poesia às pessoas que tratam dele.
É de perder e ganhar que nos fala este In Her Shoes. E não tenhamos dúvidas de que ganhámos com ele.
8 comentários:
Como é que um post sobre "In her Shoes" não tem o nome Toni Collette?
Olá Daniel!
Sinto-me na obrigação de esclarecer que o meu post não pretendia ser uma crítica ao In Her Shoes. Aquilo que escrevi foi uma homenagem a uma sequência do filme (na minha opinião, a melhor sequência de todo o filme!).
Posto isto, parece-me legítimo que não tenha mencionado Toni Collette. Primeiro porque não participa na sequência escolhida e depois porque não me parece que a sua prestação seja digna de nota. A personagem de Toni Collette não se “aguenta” nas cenas de maior tensão e os seus ataques de histeria / impaciência não convencem os espectadores. (Principalmente quando contracena com Shirley MacLaine (fantástica!) e mesmo com Cameron Diaz cujo talento continuo a defender contra tudo e contra todos.)
Gostei do seu desempenho quando confessa a importância fulcral que a irmã tem na sua vida mas, tirando esta sequência, julgo que Toni Collette tem muito a aprender.
Olá. Sim, eu percebi que era sobre a sequência, muito bonita, de que também gostei. Estava como que a meter-me contigo porque até achei o contrário que tu em relação à Collette e, assim, acho que ela arranca a melhor interpretação do filme. Era só uma pequena provocação, espero que não tenhas levado a mal. :)
:)
Claro que não levei a mal! Só posso ficar satisfeita quando os meus textos são alvo de comentários!
Ora bem, ora bem...
"In her shoes" não me encheu as medidas, longe disso.
A história está mais do que batida, irmã feia mas brilhante com problemas afectivos que se descobre como alvo de desejos vs irmã gira, burra e má que fica boa e descobre um talento para compras.
A realização também não mexeu comigo e as representações ainda menos (sinceramente a Shirley McLaine pode ser uma grande actriz mas começa a ter dificuldades com as plásticas e já apareceu várias vezes no registo velha durona mas com coração de ouro).
Dito isto, o melhor do filme são os dois poemas declamados. Este a que tu fazes referencia e o do final, lido de um só fôlego.
Bom dia Tiago!
Tenho dúvidas de que a tua descrição "velha durona mas com coração de ouro" se aplique à personagem de Shirley MacLaine.
Achas mesmo que um "coração de ouro" abandonaria as netas depois de a filha ter morrido? Nada disso. Esta avó agiu daquela forma para se proteger, para não ter de enfrentar a morte da filha, o sofrimento das netas e a dor do genro. Ora a isto chama-se comodismo e não "coração de ouro". (Os postais com a notinha não eram mais do que artefactos para expiar sentimentos de culpa.)
Daí que eu ache que esta Shirley MacLaine, ainda que com várias plásticas em cima, representa uma personagem complexa que alcança um arrependimento genuíno e tenta refazer o passado.
Cara Mafalda,
A avó foi afastada pelo pai que até escondeu a sua existência às filhas (que pelos vistos comeram tanto queijo que já nem se lembravam que tinham uma avó ou nem perguntavam por ela). Mas até aqui temos o cliché da velha forte que no final até já se ri para o velho simpático, amigo da judia desbocada (cliché, nãããã).
Peço desculpa, mas na minha máxima ignorância, não vou dizer que o filme é mau, vou só dizer que eu não gostei.
Afastada pelo pai? Uma senhora daquelas não se deixava afastar por ninguém a menos que ela própria quisesse fugir da situação.
É esta a minha opinião e acho que é nisto que reside o interesse da personagem de Shirley MacLaine.
P.S. Atenção que não considero que o filme seja o máximo. Só defendo a existência de alguns pontos bastante positivos.
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