22 agosto 2008

À deriva na internet - leituras e comentários

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I – João Tordo / Pequim 2008

Passeando pela blogosfera, descobri um texto que representa, ipsis verbis, a minha opinião sobre a prestação dos atletas portugueses nos Jogos Olímpicos. Resolvi citá-lo e ainda tomei a liberdade de destacar as minhas frases preferidas.
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Hipocrisia Olímpica
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Se tivesse sido feita uma sondagem a uma semana do início dos Jogos Olímpicos entre os portugueses, para averiguar do nosso grau de sabedoria no que diz respeito aos atletas envolvidos, os resultados teriam sido bonitos. Aposto o dedo mindinho que 95 por cento dos portugueses metiam os pés pelas mãos: "O Tri-alto? É com três varas, não é? Força Vanessa!"; "Nelson Évora, Nelson Évora....esse é o da maratona?"; já para não falar, obviamente, dos mais pequeninos: pergunte-se ao primeiro cidadão a voltar a esquina em que desporto competem Bruno Pais ou Vânia Silva, e é certo que vem aí asneira da grossa.
De repente, porém, o país transformou-se num aglomerado indistinto de especialistas em modalidades olímpicas. No outro dia, no café, ouvia um gajo refilar, indignado até ao fundo da alminha, por causa da prestação da rapariga que lançou o martelo. "60 metros...Foda-se, 68 metros fez ela cá no Estádio Nacional!". É que não há direito: essa sessão no Estádio Nacional, novidade absoluta para os portugueses e presenciada in loco por duas pessoas e um casal de pombos, parece subitamente registada na consciência do povo como uma imagem indelével do grande momento na vida pública de Vânia Silva...a "nossa" Vânia...e foram eles gastar o "nosso" dinheirinho para irem passar férias a Pequim, e depois vêm dizer que, de manhã, só mesmo na caminha...
É certo que alguns atletas tiveram comentários menos felizes; é certo que alguns ficaram aquém das prestações esperadas; mas, por amor de deus, se querem indignar-se, bem à portuguesa, indignem-se com a selecção nacional de futebol, que ganham rios de dinheiro com o Ricardo na baliza - não com rapazes e raparigas que têm "bolsas" da Federação no valor de 1000, 750 e 500 euros - diferentes escalões de mérito! - e treinam há anos debaixo de chuva e calor sem apoios, prestígio ou reconhecimento. E depois se vêem à rasca quando têm de competir com os melhores atletas do mundo, mais fortes, melhor treinados, melhor equipados, muito mais ricos. As medalhas não caem do céu. A estupidez parece que sim.
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II – José Diogo Quintela / Nomes feios

Ao ler o site do Público, dei de caras com um texto de José Diogo Quintela que muito me ofendeu.

Recapitulando, o Registo Civil veta um nome “estrangeiro”, mas não tem qualquer problema com um nome “foleiro”. Daí deixar passar também os não menos lusos (mas igualmente pirosos) Cereja, Mar ou Lua. (…) Há um sem número de trocadilhos que as crianças (e adultos parvos como eu) gostam de fazer. Como vão descobrir quando estudarem história e o professor perguntar “quantos homens já foram à Lua?” ou no recreio se cantar “a Mar enrola-se na areia”.
(…)
Ao meu miúdo tenciono chamar Azevedo. Um Azevedo, mesmo com cinco anos, não chora. Nem nenhum miúdo, mesmo dos da quarta-classe, se atreve a roubar-lhe a bola.

Pois fique o Gato Fedorento a saber que a minha filha receberá o nome de Maria do Mar Azevedo. E com muito orgulho.
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III – Jorge Mourinha / O toque humano
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Mais um texto pertinente que gostaria de ter escrito.
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Que o mesmo é dizer: os primeiros vinte minutos de "Wall-E" não têm diálogo de espécie nenhuma. E só um terço do filme, se tanto, tem diálogo falado. Nestes tempos em que o cinema quer tanto encher o olho que se carrega na espectacularidade em detrimento de tudo o resto, em que a narrativa é um simples pretexto para acumular as sequências de acção, os magos da Pixar respondem de modo absurdamente simples: fazendo da própria imagem a narrativa, integrando tudo aquilo que é necessário ao espectador para seguir a história no modo como as personagens se movimentam e interagem com o seu universo, sem recorrer a "muletas" narrativas ou diálogos.
É, em suma, cinema em estado puro: uma experiência acima de tudo visual que invoca ao mesmo tempo os pioneiros da comédia cinematográfica (Chaplin e Keaton à cabeça) e a ficção-científica distópica ("2001: Odisseia no Espaço", "À Beira do Fim", "O Último Homem na Terra" à cabeça), e que o faz dentro do quadro criativo da mais velha história do cinema - "rapaz encontra rapariga".
(...)
A palavra pode estar gasta, mas há casos em que não é possível usar outra: "Wall-E" é uma obra-prima.

18 agosto 2008

Lisboa

Pois é. O Mise en Abyme e eu estamos em Lisboa. Também estivemos no Algarve e no Alentejo a matar saudades das melhores coisas do Mundo. Comemos muitas sardinhas e esquecemos o abominável salmão fumado, único peixe à venda nos supermercados londrinos.
Infelizmente, e depois de uma vida dedicada aos tubarões, chegámos tarde e não testemunhámos a passagem do tubarão-frade pela costa alentejana. Apenas uma pergunta para todos aqueles que têm aturado esta minha obsessão: quem é que tinha razão, hum?

Para além de mergulhos no mar, este blog delirou com os prodigiosos argumentos de O Cavaleiro das Trevas e de North by Northwest. Dois filmes tão diferentes e, ao mesmo tempo, tão próximos na interpelação que sugerem: até que ponto precisaremos da verdade? O mordomo que opta por esconder a verdade de Bruce Wayne ou um Cary Grant que só descansa depois de a verdade ter sido revelada? Creio que prefiro o primeiro, mais Ibseniano.

Até breve, numa das sete colinas.

28 julho 2008

Girls just want to have fun

Para a Mary, a minha dançarina preferida.

21 julho 2008

Procura-se uma identidade

I just don't know what I'm supposed to be.
Charlotte, Lost in Translation (2003)
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Jane Campion controla-nos de maneira tão habilidosa que começamos a ver Holy Smoke como quem está a assistir a uma comédia de costumes, baseada em mais uma família problemática.
O engano persiste, sequência após sequência, de tal forma que, quando conhecemos a personagem de Harvey Keitel, convencemo-nos de que estamos a ser espectadores de uma espécie de duplicação do “Homem – SOS” de Pulp Fiction.

Kate Winslet é Ruth Barron, uma jovem mulher procurando por si mesma, pela sua essência, por aquilo que deve ser, que tem de ser, que quer ser. E, por entre dúvidas, a certeza de que é lasciva, de que quer amar e desejar; de que quer ser amada e desejada.
No episódio dos documentários, naquela mesma sequência em que a família está toda presente e há uma ovelha a servir de mesa para umas tigelas com pipocas, Ruth, depois de perceber que o pretenso guru se envolveu com a cunhada, levanta-se e refugia-se na casa de banho. Não porque a mensagem dos vídeos a tenha atingido, mas sim porque, mais uma vez, foi rejeitada. Todo o amor que, supostamente, existe dentro dela, provocado pelo culto hindu, não serve de nada quando ela se sente vazia e sem interesse. O guru preferiu a pirosa que se pavoneia de madeixas nos caracóis e calções minúsculos. O guru, tal como Ruth sabia, escolheu a “little Barbie doll”. O orgulho de Ruth está ferido. Ela é, afinal, a mulher rejeitada que põe tudo em causa, porque, na verdade, de nada serve. E será mesmo assim? Não, não é.
Ruth estava enganada e não previu que se iria transformar no único guru do filme. Um guru sexual, chamemos-lhe assim, que subjuga o homem até ao limite. Até ao ponto de este mesmo homem, habitualmente de calças de ganga e botas de cowboy, surgir no deserto de vestido encarnado, suplicando Be my bride, I love you.
Holy Smoke vive de sobressaltos, de mal entendidos, de seres primários e de seres sombrios. No meio do nada, algures na Austrália, uma mulher e um homem jogam com as consciências um do outro, indo até ao limite da perversidade, da angústia e do prazer. Agarrados a desejos que não compreendem, anseiam por atingir alguma certeza sobre si próprios.
(E não estaremos muito longe da verdade se compararmos estas almas ingénuas e sedentas de afecto a outras duas almas: Charlotte e Bob Harris.)

20 julho 2008

Summer Evening Walk

A tarde e a noite de Sábado foram passadas em Richmond Park, num passeio dedicado a mochos, árvores com mais de quatrocentos anos, morcegos e veados. Os guias ingleses, dois entusiastas da natureza, não pouparam esforços para que todos estivessem satisfeitos.
Absolutamente bestial e, pasmem, gratuito.








17 julho 2008

14 julho 2008

Frasier

Para acrescentar a esta lista.

E um forte aplauso para o senhor ali do canto que não tem papas na língua e gosta de Californication.

Isto sim, é um filme de Verão!

Bem ao gosto da silly season, Mamma Mia! decorre numa ilha grega, com marés irresistíveis, céu azul, corpos queimados, cabelos longos e inúmeras canções dos ABBA. Todo o estilo pop e kitsch dos suecos corporalizado por Meryl Streep, Pierce Brosnan e Colin Firth num filme verdadeiramente divertido, em que os actores parecem estar radiantes por participarem nesta grande festa. Sim, porque Mamma Mia! deve ser encarado como um enorme festejo, daqueles com porteiros à porta que só estão autorizados a facilitar a entrada aos verdadeiros apreciadores dos ABBA.

Li algures que este festim de gargalhadas e boa disposição estreará em Portugal no princípio de Setembro. Preparem-se porque, depois do filme, fica-se com uma vontade frenética de saltar para cima de uma mesa e desatar a dançar como se não houvesse amanhã.

09 julho 2008

Notas soltas

Em Londres há chuva. Em Lisboa há sol. Em Londres há parques. Em Lisboa há praias. Em Londres há miúdas com problemas de pele. Em Lisboa há miúdas com salero. Em Londres há mercado para boas ideias. Em Lisboa as coisas não mexem. Os londrinos cuidam da cidade. Os lisboetas destroem a cidade com latas de tinta em spray. Em Lisboa há calçada portuguesa. Em Londres há um pavimento incolor. Em Lisboa há lixo pelas ruas. Em Londres está tudo limpo. Em Lisboa os transportes públicos não funcionam. Em Londres não se desespera por um autocarro. Em Lisboa há boas vibrações pelo ar. Em Londres há más vibrações pelo ar. Em Lisboa, os homens das obras são ordinários. Em Londres, os homens das obras são educados. Em Lisboa ninguém respeita regras. Em Londres quase todos cumprem as regras. Há cada vez menos comércio independente em Lisboa. Há cada vez mais comércio independente em Londres. Em Lisboa, os funcionários públicos não fazem nenhum. Em Londres, os empregados de uma estação de correios são trabalhadores incansáveis. Em Lisboa come-se bem em qualquer lado. Em Londres não se come bem em qualquer lado. Em Lisboa respira-se um ar saudável. Em Londres respira-se um ar inóspito. Em Lisboa paga-se para entrar em museus. Em Londres não se paga para ver obras-primas. Em Julho, os lisboetas têm calor. Em Julho, os londrinos escondem-se dos trovões. Lisboa é a minha cidade do coração. Londres é a cidade onde me sinto uma cidadã do mundo.

06 julho 2008

Ecrã versus “vida real”

Dias depois de ter escrito sobre Pi e de ter publicado uma fotografia do realizador e da mulher, dou por mim a tropeçar na actriz Rachel Weisz. Incrivelmente simples, cabelo ondulado, calças de ganga e pernas magras. Uma epifania, diria mesmo.

04 julho 2008

Conhece-te a ti mesma

Viver em modo inglês

- Andar à chuva e já nem me aperceber,

- Sair à noite de manga curta e não ter frio,

- Tomar duche sem pressão e não me importar.

Um beijinho à tia Romy, de Romy Schneider, e ao João.

27 junho 2008

Vizinhança

Foi há uns dias que dei por mim a desconfiar destes londrinos, sempre tão respeitadores e metódicos. Um povo que insiste na libra, na condução à esquerda e nas tomadas com três pinos, tem de guardar uns quantos podres no armário.
Com esta convicção na manga, dei início às lides de Mata Hari, qual James Stewart, no clássico Rear Window. Por detrás destas janelas, escondiam-se a minha cabeça e o meu olho de lince, sempre prontos a espiar os vizinhos. E, por falar em vizinhos, lembram-se da série Neighbours, com a Kylie Minogue? (Neighbours, everybody needs good neighbours…)
Mas enfim, nada de desvios que o assunto é sério.

Depois de ter deixado de lado o casal turtle-frog, projectei toda a minha habilidade de espionagem num homem novo, sempre de manga cava, que, todas as manhãs, entrava no seu Ferrari encarnado, com a matrícula Kiss Red, e dava umas valentes aceleradelas. Ritual estranho, não? Sentava-se, acelerava e voltava para casa. Ali havia gato.
E foi então, numa bela tarde com jogo do EURO à vista, que o mistério se desvaneceu. O nosso amigo, como habitualmente, dirigiu-se até ao carro, abriu a porta e, horror dos horrores, colocou uma bandeira portuguesa no vidro. Era português, tinha um Ferrari e usava manga cava. Demorei muito tempo a recompor-me de tamanho pavor.
Agora, depois de Portugal ter sido eliminado, o meu vizinho continua a acelerar. No entanto, mudou de carro. O Kiss Red desapareceu e deu lugar a este magnífico “el” Toro.

24 junho 2008

Cool Hand Luke - II

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He was smiling... That's right. You know, that, that Luke smile of his. He had it on his face right to the very end. Hell, if they didn't know it 'fore, they could tell right then that they weren't a-gonna beat him. That old Luke smile. Oh, Luke. He was some boy. Cool Hand Luke. Hell, he's a natural-born world-shaker.

Azul pronuncia-se como Paul Newman

Cool Hand Luke (1967)

20 junho 2008

Trivialidades londrinas



1) Primark – a loja de roupa para mulheres rijas

Quarenta minutos para entrar num provador e mais trinta minutos à espera de chegar a uma caixa de pagamento. Isto, claro, sem contar com o tempo em que se anda de um lado para o outro, aos encontrões, solavancos e tropeções, a examinar a imensa variedade de roupas e acessórios.
As crianças choram, os homens bufam e as mulheres, zonzas no meio de tanta desordem, experimentam bikinis e saias à frente de toda a gente. É o vale tudo. Seja fim-de-semana ou dia de trabalho. Seja de manhã ou de tarde. Conta-se que até já houve pancadaria entre fêmeas.
Vale a pena o sacrifício? Sem dúvida. Primark é a loja mais barata de sempre. Ainda mais acessível do que a Bershka ou a Zara de Lisboa.


2) Camden – o bairro cool

Pessoas diferentes, sons originais e odores desconhecidos. Entra-se em Camden e está-se num mundo à parte. Nunca se viu tanto arrojo, originalidade e bom gosto num só espaço.


foto © Miss Wasted Blues

foto © Miss Wasted Blues



foto © Miss Wasted Blues


foto © Miss Wasted Blues


foto © Miss Wasted Blues



foto © Miss Wasted Blues



foto © Miss Wasted Blues
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3) Forbidden Planet – o cinema transformado em merchandise

O Mise en Abyme foi lá e não resistiu a trazer este brinquedo. Basta carregar nos botões e ouvem-se seis frases diferentes do épico Reservoir Dogs. E há aparelhos iguais de filmes tão díspares como Dirty Dancing ou Scarface (Say hello to my little friend!).
Ideal para utilizar quando a nossa casa for assaltada, à lá Macaulay Culkin no Sozinho em Casa.