03 maio 2011

E um dia, pela manhã

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"Bergman explica a uma jovem actriz a razão pela qual não vão repetir uma cena. Ela acha que podia fazer melhor. Ele, Bergman, acha que é suficiente. A hierarquia, no sentido vertical e ascendente, tende a esquecer porquês e esvaziar explicações. Porquê? Porque sim. Ele, oitenta e quatro anos e longuíssima carreira no cinema, explica a uma muito jovem “Karin” que, se repetidas as cenas, até ao cansaço, na busca de uma desejada perfeição, as emoções nelas contidas artificializam-se, perdem-se. Se repetires uma coisa muitas vezes crias uma fórmula. Esqueces-te da razão por que a dizes, do sentimento que juntou as sílabas, aplicas, para resolver a equação do fim do telefonema, do fim da conversa no café, da despedida matinal, a fórmula que um dia já foi palavra. A tua palavra. Agora fórmula. Se repetires uma coisa muitas vezes crias uma fórmula. Não queiras ouvir todos os dias o verbo amar. Bergman explica a “Karin” que se repetirem demasiadas vezes a cena da cozinha as emoções perdem-se. Não vale a pena buscar a perfeição se esta te custar a emoção original. Mas, à cautela, diz: “se te diverte podemos repetir”. Ela confia. Não repetem a cena."


Roubado daqui.

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