10 novembro 2007

Eu estive lá

Peguei no meu vestido de Marilyn Monroe, desafiei a sósia da Helen Hunt e lá fomos as duas, cheias de glamour e inocência, à primeira noite do European Film Festival. Chegadas à porta do Casino do Estoril, cruzámo-nos com o Pedro Almodóvar e as suas divas. Respirámos fundo e dirigimo-nos ao salão onde foi servido o jantar.
Apesar do meu colossal astigmatismo, estava seriamente convencida de que ia ver o Bernardo Bertolucci, a Asia Argento, a Carole Bouquet e a Chiara Mastroianni. Esforcei-me ao máximo para os localizar no meio daquela salganhada de gente mas não consegui. Nada. À nossa volta, só pairavam meninos do Estoril de fato e gravata, apresentadores da TVI de smoking, gestores insuportavelmente bem sucedidos, editores arrogantes e portuguesas atarracadas. Uma enorme desilusão. E, no meio de tudo isto, o gangster do Paulo Branco, cheio de si, a passear-se de um lado para o outro.
Veio a comida. Sopa de lavagante e coxas de pato para animar as hostes. Saboroso, sem dúvida, mas o desencanto já pairava. Seguiu-se o Rodrigo Leão e ninguém se calou para o ouvir. Continuavam os mexericos, as conversas de chacha e um enorme tédio. Nada de cinema, nada de cinéfilos, nada de estimulante. A sósia da Helen Hunt e eu viemos embora. Já não tínhamos alento para ouvir o Bernardo Sassetti. Cheguei a casa, adormeci e as palavras do Daniel ecoaram nos meus sonhos.

Acabando com as citações e pegando nestas últimas palavras, este Festival de Cinema Europeu não vai fugir ao estatuto de evento. Casino Estoril e Cascais Villa? Bilhetes a 4 e 6 euros? Os filmes em competição vão ter futuro diferente dos do Doc ou do Indie? O objectivo principal é ter projecção e estimular a reflexão? Não me fodam. O curioso desta entrevista é que tudo o que é negativamente apontado ao Doc, vai poder ser apontado a este, quase de certeza.Dito isto, falta dizer que na Competição deverão estar umas pérolas que pouca gente vai ver e outros filmes mauzinhos, a mostra fora de competição é interessante e bem que gostaria de pôr coisas em dia, mas o combustível é um roubo, não tenho passe de comboio e mesmo que tivesse demoraria mais de uma hora a lá chegar. Não meto lá os pés.

11 comentários:

Daniel Pereira disse...

É revoltante.

Miguel Marujo disse...

Não fui, imagino como terá sido, mas deve ter valido pelo vestido de Marilyn Monroe e a sósia da Helen Hunt. ;)

Anónimo disse...

Parabéns sósia do Tau-tau! Texto directo para o Público!!!

Anónimo disse...

hum

C. disse...

De facto, os preços dos bilhetes são caros para um festival. Mas a desculpa do Estoril não pega, não pode ser tudo em Lisboa!

Quanto ao festival em si, tenho visto muito pouco, que o tempo é escasso.

Anónimo disse...

Cara Mafalda,

Percebo a desilusão, no entanto, gostava de dizer:
1- Não é num primeiro festival que se encontram todas as estrelas.
2- Foi o Paulo Branco que fez o festival vir para cá. Querer um festival com estrelas e dizer mal de quem o tenta fazer parece-me ligeiramente incoerente.
3- Esta é para o Daniel e não para ti, querer que tudo se passe em Lisboa é extremamente provinciano e redutor. Esse senhor está-se a esquecer que muita gente mora fora de Lisboa e que para eles é tão ou mais fácil ir ao Estoril como ao S. Jorge.

Dito isto, parabéns pela publicação no Público.

Tiago C.

Mafalda Azevedo disse...

Ora viva Tiago C.!

Parece-me que os comentários nº1 e nº2 vêm de alguém que não compreendeu o texto que escrevi.

Não lamento a “falta de estrelas” e também não desejo "um festival com celebridades”. Nada disso. Aquilo que critico, e lamento se o meu sarcasmo não foi eficaz, é que haja um senhor como o Paulo Branco, dono e senhor do cinema português apesar de dever dinheiro a mais de metade dos realizadores nacionais, que organizou uma suposta Super Hiper Mega Gala de Abertura de um Festival Europeu de Cinema que, na realidade, não passou de um desfile constrangedor para gente que não se interessa por cinema e que não tem educação para sequer respeitar um concerto do Rodrigo Leão.

And that is the question!

Anónimo disse...

The question is Mafalda, que esperavas ir a Holywood e foste para a Feira popular.

Infelizmente é a nossa realidade.

A nossa realidade também é de criticar logo a abrir.
O festival ainda vai a meio. Gostava de ver um balanço total sobre o cinema e não uma critica social sobre um evento.
É isso que espero de ti (e que sei que és capaz) de não cair na critica do social mas falar da programação do festival, dos filmes que viste ou que vais ver. Dos filmes que não queres perder. Das boas e más surpresas do festival.

Fala-me e aconselha-me em filmes, é isso que espero de ti.

Com muita franqueza e ainda maior amizade,
Tiago C.

Mafalda Azevedo disse...

Querido Tiago,

As tuas palavras denunciam o quão estás por fora daquilo que é o cinema português. Se estivesses um bocadinho mais por dentro do assunto, compreendias a intenção do meu texto e não me interpretavas mal. Logo a mim que, como bem sabes, frequento festivais de cinema e já trabalhei em três deles, executando diferentes tarefas… Logo eu que defendo tanto o cinema português e que me oponho a esse espírito do “criticar logo a abrir”… Mas enfim… Ainda no outro dia, uma querida amiga dizia-me que o único território onde faz sentido dar opinião é essa selva a que se chama eufemisticamente a sociedade. Eu cá acho que ela tem toda a razão. Ainda para mais, quando vivemos num país onde há pessoas como o Paulo Branco que não sabem distinguir um Festival de Cinema de uma triste feira de vaidades.

Daniel Pereira disse...

Caro Tiago, (e também Wasted Blues), deixe-me esclarecer que quando ponho o Cascais Villa e o Casino Estoril em causa não é pela sua localização geográfica, ainda que seja essa a razão de não pensar ir ao Festival - esse, porém, é um problema meu, pessoal.

O que pus em causa, desde logo, foi o espaço Casino Estoril enquanto local de cinefilia. Não conheço a sala, até pode ser a última maravilha da Terra, mas, e eu escrevi o meu texto antes do Festival começar, tal local deixa-me imediatamente com imensas reservas. Pode-me acusar, sim, de ter preconceitos em relação ao Estoril e a Cascais, que os tenho com probablidade de cometer alguma injustiça, mas não almejo ser mais do que a pessoa com defeitos que sou.

Isto para dizer que não reclamo, de forma alguma, que tudo se passe em Lisboa (ainda que, no plano pessoal, isso seja óptimo.

A grande diferença, e para terminar, é que enquanto há aqueles que encaram com normalidade que uma pessoa como o Paulo Branco organize um festival em Estoril e em Cascais em registo de happening, e que depois as pessoas lá vão para socializar não querendo saber do cinema, eu sou daqueles que prefere que o cinema seja para quem não o tem e que o queira, isto é, para quem o mereça. Quando quiserem fazer festivais de cinema no interior em que o público alvo seja aquele que nunca foi ao cinema, contem comigo.

Não tem nada que ver com o que é melhor para mim, tem que ver, sim, com o que é melhor para o cinema e para o mundo.

Anónimo disse...

Caro Daniel e Mafalda,

Penso que estamos a falar de coisas diferentes.
Uma coisa é um festival para divulgação do cinema e outra coisa é um festival para vender cinema.
Vou tentar dar um exemplo, no turismo e no ramo alimentar é normal existirem feiras abertas ao público e feiras só para profissionais. As primeiras têm o objectivo de vender o pacote ao consumidor enquanto que as segundas têm como objectivo de dar aos vendedores um conhecimento do que existe no mercado e atrair investimento. Normalmente, também são as segundas que têm maior pompa e galas e etc.
Passando agora para o European Film Festival, apesar de nunca ter participado em organizações de festivais e estar a anos de luz do que se passa no cinema português, penso que o objectivo deste festival não é divulgar cinema mas trazer investimento e dinheiro e isso, por muito que custe aos mais puros ideais, faz-se à custa de festas e de locais que impressionam.
Deixo uma questão de perfeito ignorante: em que salas passa o festival de Cannes? Além do festival, há mais projecções?

Obrigado pelo tempo que me dispensaram.

Tiago C.